sexta-feira, 15 de março de 2019

"Cadastro Positivo": o pesadelo que está por vir


Segundo a notícia Senado aprova cadastro positivo, que vai à sanção presidencial, o "cadastro positivo" vai passar a englobar automaticamente toda a população do Brasil. Na China isso já existe em estado avançado: o "Sesame Credit" é um sistema que cruza informações de cada pessoa (desde suas postagens nas redes sociais, as pessoas com quem se relaciona, os lugares que visita, as compras que faz, seu comportamento na vida cotidiana etc.) para liberar ou não o crédito (que é o dinheiro em si) em todas as coisas que cada pessoa faz, inclusive o acesso ao transporte público, acesso a estabelecimentos, serviços, compras etc.

O Incrível é que Marx, estudando as entranhas mais viscerais do sistema creditício no século XIX, já percebia exatamente isso:

"O crédito é o julgamento que a Economia Política realiza sobre a moralidade de um homem. No crédito, em lugar do metal ou do papel, é o próprio homem que se torna o mediador da troca - não como homem, mas como modo de existência de um capital e de seus juros. Assim, deixando sua forma material, sem dúvida o meio de troca retornou ao homem e se reincorporou ao homem, mas unicamente porque o próprio homem lançou-se para fora de si e se tornou para si mesmo uma forma material. Não é o dinheiro que se suprime no homem no interior do sistema creditício; é o próprio homem que se converte em dinheiro ou, noutra expressão, é o dinheiro que se encarna no homem. A individualidade humana, a moral humana, transformam-se, simultaneamente, em artigo de comércio e na existência material do dinheiro. Em lugar do dinheiro, do papel, é a minha existência pessoal, a minha carne e o meu sangue, a minha virtude social e a minha reputação social que se tornam a matéria e o corpo do espírito do dinheiro. O crédito calcula o valor monetário não em dinheiro, mas em carne e coração humanos. Este é o ponto em que todos os progressos e todas as inconsequências ocorrentes no interior de um sistema falso constituem a suprema regressão e a suprema consequência da abjeção.

No interior do sistema creditício, a natureza alienada do homem se afirma duplamente sob a aparência do máximo reconhecimento econômico do homem:

1º) entre o capitalista e o trabalhador, entre o grande capitalista e o pequeno capitalista, aprofunda-se a oposição, porque o crédito só é concedido a quem já possui, constituindo para o rico uma nova oportunidade de acumulação, enquanto o pobre - cuja existência depende dessa oportunidade - a vê assegurada ou negada segundo o arbítrio do rico ou conforme a opinião casual formada sobre ele;

2º) a mistificação, a hipocrisia e a vigarice recíprocas são levadas ao cúmulo; quanto àquele que não recebe crédito, não é julgado apenas como um pobre, mas também moralmente, como quem não merece confiança nem estima, um pária, um homem mau - à miséria do pobre soma-se a humilhação de rastejar para mendigar crédito ao rico;

3º) dada essa existência completamente ideal ao dinheiro, o homem pode praticar a falsificação monetária não só sobre qualquer matéria, mas ainda sobre a sua pessoa: o próprio homem, forçado a falsificar sobre si mesmo, deve simular, mentir etc. para obter crédito; assim, o crédito se torna - tanto para quem o concede quanto para quem o solicita - objeto de tráfico, de engano e de abuso mútuos. Aqui se revela, com toda a clareza, como, na base dessa confiança econômica, estão: a desconfiança, o cálculo suspeitoso para conceder ou negar o crédito; a espionagem em busca dos segredos da vida privada do solicitante; a denúncia de dificuldades momentâneas de um concorrente para desacreditá-lo etc. - todo esse sistema de falências e empresas falsas... No crédito público, o Estado ocupa a mesma posição que acabamos de caracterizar para o homem particular. Na especulação com os valores públicos, vê-se muito bem como o Estado se tornou o joguete dos comerciantes etc;

4º) enfim, o sistema creditício encontra seu acabamento no sistema bancário. A criação do banqueiro, o poder público da banca, a concentração da fortuna nessas mãos, este areópago econômico da nação, eis a digna coroação do sistema monetário. Quando, no sistema creditício, a avaliação moral de um homem, assim como a confiança no Estado etc, toma a forma do crédito, o mistério que se oculta sob a mentira dessa avaliação, a infâmia imoral dessa moralidade, tanto como a hipocrisia e o egoísmo dessa confiança no Estado - tudo isso emerge e aparece à luz do dia tal como é na realidade.” (Karl Marx, Cadernos de Paris, 1844)



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